Colhi um
pouco de luar. Guardei-o numa caixa singela de madeira, cor azul de céu, e cor
verde dos campos.
Nos dias
tristes e enevoados do nosso viver, levanto num golpe rápido e curto a tampa da
caixa, soltando um pouco de luz, que vai alimentar as estrelas dos sonhos que
acalentamos, na esperança de um dia os concretizar.
Muitas
foram as vezes que repeti este gesto, no acto de abrir e fechar a minha caixa
de madeira azul esverdeada, que aos poucos a luz do luar guardado nela, vai
esmorecendo e surgindo mais pálida, na medida em que os anos avançam, e o tempo
passa.
Ainda
consigo contabilizar alguns dos sonhos que se iluminaram e concretizaram. A
esperança ainda lá está igualmente guardada na minha caixinha de madeira,
aguardando o seu chegar ao fim da linha, pois o comboio da vida, tem uma última
estação obrigatória, de chegada sem retorno.
A luz do
luar preciosamente guardada na minha caixa de madeira, extinguir-se-á um dia.
Com ela partirão todos os sonhos, pois as esperanças serão as primeiras a
partir, levadas pelos cabelos brancos criados pelos tempos e espalhados pela
terra.
Enquanto
existir uma réstia de luz do luar na minha caixa, continuarei a somar dias e
horas à minha existência, procurando fazer e desfrutar dos pequenos prazeres da
vida, todos aqueles que me forem possíveis concretizar, no respeito pelos que
me rodeiam, e que comigo partilham esses momentos, sem esquecer a mãe natureza.
Todos
devíamos ter direito a uma caixinha de madeira, mesmo que de cores diferentes.
O luar é imenso, e um pouco da sua luz armazenada na caixinha de cada um de
nós, não faria diferença. Mas sermos ou não possuidores da nossa caixinha,
guardá-la só para nós, é fundamental na construção do dia a dia.
Este desejo
e ao mesmo tempo voto, extensivo a todos, não se trata de um acto egoísta.
Antes pelo contrário, pois é de dentro dessa caixa, que encerra um pouco da luz
do luar, que conseguimos comunicar e partilhar uns com os outros, concretizando
sonhos e desejos, executando projectos, espalhando paz e alegria pelos que nos
rodeiam. É lá de dentro que retiramos toda essa força que nos permite
ultrapassar obstáculos, e dominar a dor que por vezes no nosso íntimo sentimos.
Cada um de
nós deve ser responsável pela sua caixinha, saber utilizá-la com parcimónia e
critério, sem pressas, sem cobiçar a caixa do vizinho.
Já muitas
foram as caixinhas que perderam a sua luz do luar nelas encerrada. Muitos já
partiram no términus da sua luz interior, mas o luar continuará resplandecente,
preenchendo outras novas caixas, sinal de continuidade, sinal de vigor e de
desejo, rumo a um futuro incerto, para o qual só há um caminho: em frente,
sempre…
S. Cruz, 05/10/2014