Não será pelo facto de, muitas vezes, fazer a
mesma caminhada – entre a Estefânea e o Caminho da Fonte dos Amores, através de
ruas imensamente familiares, cujos ínfimos detalhes conheço e reconheço como os
da palma da mão – que desaparece ou se atenua a sensação de agressão em relação
a tudo quanto de menos positivo vai aparecendo diante dos meus olhos.
Aliás, neste
contexto, será em sentido oposto o testemunho a partilhar já que, na ausência
de intervenções de beneficiação, as razões de queixa apenas se agravam. Se
perguntarem a que tipo de agressão me refiro, confesso que, a mais
desconfortável, me levará a mencionar cenários que, há décadas, constituem
desgosto dificilmente suportável.
Tempos houve
em que, muito provavelmente, devido a falhas de lucidez que a idade se
encarregou de suprir, consentia eu que tal quadro me avinagrasse os dias.
Actualmente, não. Depois de um fartar de promessas e de muitas palmadinhas nas
costas, consigo caminhar serenamente, sem as dores que outros devem carregar…
E, assim,
aliando os benefícios para a saúde de uma caminhada diária de seis quilómetros,
tenho o privilégio de fazer um percurso invejável – que, em qualquer parte do
civilizado mundo, sempre seria incensado devido aos seus incomparáveis e
sucessivos ingredientes de beleza – mantendo a boa esperança de que seja
transposto o cabo a partir do qual estará à vista a solução para as questões em
presença.
Gerais mas bem concretos
Poderia
detalhar a rua de pavimento tão irregular que até os condutores de veículos todo
o terreno têm dificuldade no seu controlo? Claro que sim. Mas, se o fizesse
também teria de me referir ao seu troço pedonal, cinzentão, mal feito,
impermeabilizado, a coisa mais horrível de Sintra, antiga artéria comercial
cheia de movimento, que, desde o início do século XXI, passou a ser um
inqualificável cemitério, tantas vezes transformado em inqualificável parque de
estacionamento…
Não, neste
escrito, não há necessidade de ir identificando, porque são perfeitamente
conhecidos os precisos objectos do desconchavo. Assim, apenas em termos gerais,
é que lembro os escorregadios, sujos, irregulares e perigosos passeios, com os
lancis partidos, impróprios para pessoas normais e, muito menos, cidadãos com
mobilidade reduzida e pais que tenham de empurrar carrinhos ou cadeiras de
bebés.
Ou os muros
descuidados. E os fios eléctricos pendurados? E as casas? Várias neste
percurso, em ruína imparável, decadentes, absolutamente periclitantes, algumas
com arbustos crescendo na ponta do telhado, fachadas descoloridas, rachadas, a
desfazerem-se, janelas podres, vidraças partidas, deixando aperceber o interior
desventrado.
Trata-se de
propriedade particular? Nalguns casos, é verdade. E não haverá dispositivo
legal que resolva esta questão que carrega um legado de geracional mas tão
característica incompetência? Contudo, também há edifícios do património
municipal. Por exemplo, na Alfredo da Costa. Claro que não há necessidade de
identificar…
Em pleno
centro histórico, na Vila Velha, além do mais recente desmando da esplanada,
multiplicam-se os casos afins do quadro e da moldura a que venho aludindo. Para
quê continuar alinhando mais motivos de desgosto? Com o risco de ser
contraproducente?
De uma vez por todas!
Em
contrapartida, muito melhor me sinto repetindo a ideia que, tantas vezes, tenho
partilhado no sentido de operacionalizar uma entidade gestora da sede do
concelho, abrangendo todo o território definido pelas anteriores três
freguesias. Em qualquer parte do mundo, com desafios congéneres aos de Sintra,
a gestão local é extremamente exigente, totalmente focalizada para a
sofisticação dos lugares únicos com que deve estar preocupada, única e
exclusivamente preocupada.
De tal modo
importantes e sui generis são as
necessidades, deste coração do concelho que só uma entidade exclusivamente
dedicada, bem dotada de recursos humanos e materiais, com uma boa transferência
de competências, poderá estar à altura dos desafios. Para o efeito, porque não
se trata de matéria para brincadeira, jamais pensaria na União das Freguesias
de Sintra…
“(…) mantendo a boa esperança de que seja transposto o
cabo a partir do qual estará à vista a solução para as questões em presença.
(…)”
Com tão
sincero desejo, poderia terminar. Se não o faço de imediato, é porque gostaria
de recordar uma tão sincera quanto frequente atitude do Dr. Basílio Horta.
Homem que tem servido a República nos mais diferentes postos da Administração,
com larguíssima experiência de direcção e gestão, a quem o país deve
inestimável empenho na defesa dos interesses nacionais, o actual Presidente da
Câmara Municipal de Sintra queixa-se imenso da lentidão dos procedimentos
administrativos.
Como não
entendê-lo? Na realidade, como não concordar quanto à ideia de que tudo parece
armadilhado para obstaculizar as melhores vontades de bem resolver as situações
apontadas? De qualquer modo, perante o desabafo do edil, como toda a
compreensão deste mundo, nada adianta para que, em tempo oportuno, os munícipes
vejam satisfeitos os seus anseios, então, o que fazer?
Embora com o
risco de que seja entendida como simplista ou redutora, a solução passa pela
assunção plena, por parte de executivo municipal, de um dos grandes princípios
da Democracia e do Estado Democrático de Direito, qual seja o do inequívoco
exercício da autoridade democrática que detém para cumprir e fazer cumprir as
leis em vigor.
Se tal
estivesse a acontecer, em vez da institucionalizada cultura do desleixo, que
subjaz a todas, todas as situações anteriormente referidas, razões não teríamos
para manifestar estes desgostos.
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