quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Abriram a caixa...


JOÃO CACHADO

No princípio deste ano, aquando do atentado ao Charlie Hebdo, não fui capaz de aderir àquela onda generosa do slôgane Je suis Charlie e, no dia 11 de Janeiro, nesse contexto da minha cínica incapacidade, escrevi um texto publicado nas redes sociais do qual passo a reproduzir o seguinte excerto:

 "(...) Tenho a maior das dúvidas acerca da «eficácia» desta mega-manifestação em curso entre a République e Nation. Está ali concentrada a crème de la crème dos «estadistas» da classe política europeia, com nível mais que duvidoso,... responsável pelo statu quo que enquadra e «viabiliza» o surgimento de fenómenos como o que emoldura o terrorismo jiadista. Ou, de facto, se dispõem a mudar a política que têm conduzido, ou esta marcha perde qualquer significado. (...)"

Hoje, 14 de Novembro, recorrentemente, só me ocorre a cena antológica em que certo Primeiro Ministro do governo de um periférico Estado europeu - que, não muito mais tarde, guindando-se ao supremo cargo de Presidente da Comissão Europeia, colheu as subsequentes «mais-valias» do seu heróico feito - recebia nos Açores a quadrilha dos malfeitores que destaparam a caixa de Pandora ao decidirem a segunda Guerra do Golfo, contra o ditador que, pretensamente, dispunha de armas de destruição maciça.

Passados doze anos, no dia 3 deste mês, morreu em Bagdad, Ahmed Chalabi, xiita laico ultra-ortodoxo iraquiano, que passou aos neocons americanos a mentira da posse de armas químicas e biológicas pelo regime de Saddam Hussein, mentira que, sabiamente aproveitada, não podia ter sido servida mais a tempo e tão a propósito da gula avassaladora dos senhores da guerra, afinal, tão bem amestrados por Bush e Blair.

Xiitas contra sunitas, pondo em causa os equilíbrios mais instáveis do planeta, destruindo Iraque, Líbano, Síria, Líbia, mancha de óleo alastrando num campo que a embebe em sorvos imparáveis, eis o cenário que, inevitavelmente, a jusante, apresenta estes «efeitos colaterais» de actos terroristas levados a cabo nas grandes metrópoles.

Paris, Londres, Madrid, Nova Iorque «vítimas» de ignorantes implacáveis, de títeres habilmente manipulados, que recrutam para a guerra santa miúdos desenraizados, descrentes, subprodutos de inimagináveis subúrbios? Aparentemente, também. Contudo, convém evitar a precipitação de juízos «confortáveis». A lucidez, mãe do desassossego, não nos concede território para mais asneiras. E nós é que somos os senhores do Mundo!

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