sexta-feira, 6 de junho de 2014

Um Vizinho Ilustre na vila de Belas setecentista

RUI OLIVEIRA

       



O Infante D. Manuel de seu nome completo Manuel José Francisco António Caetano Estêvão Bartolomeu de Bragança, foi o sexto filho de Pedro II de Portugal e de sua esposa, a Rainha D. Maria Sofia de Neuburgo. D. Manuel Bartolomeu deambulou cerca de duas décadas pelas grandes capitais das Cortes da Europa, onde sempre foi acolhido com deferência, afinal era irmão do Grande D. João V. dessa epopeia pessoal e ousada ficou-nos alguns relatos escritos nas Gazetas então publicadas um pouco por toda a Europa como o Journal de Verdun que regista os movimentos do príncipe; e a sua fama mundana inspirou dois escritores franceses contemporâneos: Madame Dunoyer, nas suas Lettres Historiques et Galantes, descreve com admiração as graças do príncipe e as festas dadas em sua honra pelo conde de Tarouca. O Abbé Prévost no seu livro Mémoires et Aventures d'un Homme de Qualité que s'est retiré du Monde, vol. IX informa que :“Obrou feitos de guerra nos Balcãs”; com o apoio do imperador da Áustria, esteve quase a ser rei da Polónia; em 1732 foi o seu nome lembrado para receber a nova coroa da Sardenha e da Córsega; faltou o apoio político e económico do seu irmão Rei D. João V. Este “aparente alheamento” de D. João V ao “protagonismo”, nas Cortes da Europa, do seu irmão Manuel era um assunto com origens de cunho muito pessoal de relação familiar. Aos 18 anos o Infante embarcou, a 4 de Novembro de 1715 (Gazeta de Lisboa, n.º 20, imagem abaixo), secretamente para os Países Baixos num barco inglês, sem consentimento do Rei seu irmão, com destino à Holanda. A pedido seu regressou à pátria, veio por Paris, onde foi hóspede do conde da Ribeira Grande. Mas voltou a fugir, frustrando os intentos de D. João V, seu irmão. Na sua fuga de Lisboa, sem ordem, deixa extensa carta ao irmão Rei, afirmando que «ia servir ao Imperador seu primo na guerra da Hungria» onde lhe pedia que o assistisse «com o que cá lhe dava e com o mais que esperava da sua real grandeza». As verdadeiras razões desta fuga, não estão completamente definidas. D. António Caetano de Sousa diz, na sua História Genealógica da Casa Real Portuguesa, de 1741, que o Infante partiu porque seu espírito belicoso ansiava pela glória dos combates e Portugal estava em paz. Outros investigadores comentam que o Rei queria que o irmão tomasse Ordens Sacras, uma vez que estava em curso a criação da Patriarcal, 1716. Pinheiro Chagas (História de Portugal 1869-1874) comenta que, «depois de deplorável desavença, o Rei perdera a cabeça e lhe dera uma bofetada em público; fugira para apagar a nódoa na sua honra, em movimento de arrebatada indignação. Sua popularidade aumentou.» Veríssimo Serrão, em  «História de Portugal», volume V, página 248, diz que «Bebeu na educação, uma forma de altivez que tinha as marcas da valentia e do pundonor, haja vista uma das divisas que compôs aos 10 anos: «Mais devem os homens estimar perda da vida com honra do que viver com infâmia».
Na sua fuga fez-se acompanhar de uma restrita comitiva de três pessoas. Um filho do Conde de Tarouca, Manuel Teles da Silva, da sua idade, mais dois moços criados, um reposteiro e outro de serviço geral, algumas jóias, 20 mil cruzados em prata e uma letra do mesmo valor, da parte do comerciante Manuel de Castro Guimarães, para receber em Londres. Foram os parcos meios com que chegou à Holanda.
A sua vida aventurosa na Europa terminava em 1734. Regressa a Portugal, cheio de dívidas, uma vez que o seu Irmão, D. João V, sempre se recusou sustentar seu estilo efusivo de vida e pretensões políticas, conforme demonstrou Ernesto Soares na sua obra «O infante D. Manuel (1697-1766). Subsídio para a sua biografia» que se alicerçou em documentação coeva. Partindo de Baiona com um séquito, de 22 pessoas, entre as quais o capuchinho padre Agostinho de Lugano, pregador do Imperador, chegou a Lisboa a 21 de Outubro, véspera do aniversário do rei, mas uma vez desembarcado, o encontro de reconciliação entre os dois irmãos – com sinais externos de afecto e ternura – apenas veio a dar-se em Mafra, dois dias depois, onde se encontrava a Família Real. Sabe-se, também, que as dívidas foram parcialmente pagas mediante um adiantamento de rendimentos da herança paterna. A partir de 1734, a sua residência é fixa no Paço dos Senhores de Belas, na Vila de Belas. Neste Paço e quintã, já então paradisíaca, os movimentos do Infante eram vigiados, por dois guardas. Não podemos deixar de salientar, aqui, o facto de os Senhores de Belas terem, entre outros cargos, o de capitães da Guarda da Guarda Real desde o tempo de D. João IV.
A Comitiva do Infante, ali residente, não iria além dezena e meia de pessoas, uma clara redução do séquito com que regressou ao reino. Duas a três famílias que seguramente o acompanhavam desde as suas andanças pela Europa oriundas, pelo menos duas, os Herigoyen e os Paçamana, de Baiona, e os Andrade Moreyra e Casquete de Madrid e Ceuta. Sabemos da existência destas pessoas a residir em Belas, na Vila e no Paço. A partir dos Registos Paroquiais de Belas, nomeadamente o de Baptismos, onde temos os assentos de nascimentos e baptismos de várias crianças em que o Sereníssimo Infante D. Manuel Bartolomeu é padrinho. Uma dessas famílias, os Herigoyen, acabam por se estabelecer na vila em “um pedaço de chão e baldio, junto ao curral do Concelho” que o senhor D. Luís Castelo Branco faz aforamento a “Martinho (de Martim) Harigoyem Castanheiro, criado do Infante D. Manuel”(Cart. Not. de Belas). Do seio desta Família nasceram duas crianças, ambas afilhadas do Infante D. Manuel, uma rapariga, a Clara, e um rapaz, o Manuel José Herigoyem Registado com os dois primeiros nomes do ilustre padrinho. Este Manuel José Herigoyen vai ganhar uma notoriedade surpreendente como arquitecto e engenheiro militar, na Alemanha do Século XIX (olimposintrense.blogspot.). O seu pai Martinho era Wagomestre do Infante, isto é especialista em carros (carroças) de transporte e coches. Um negócio rentável na época da grande construção do palácio de Mafra.



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