quarta-feira, 15 de julho de 2015

O jogo da “batota” e o castigo!

RUI OLIVEIRA


O João de Belas, Feitor na Armada de Ormuz, capitaneada por Gonçalo Duarte de Lemos, por falecimento de Gomes de Figueiredo, em cuja feitoria esteve entre Janeiro de 1510 e Junho de 1511, foi um “Ilustre” vizinho de Belas que a toponímia local regista como navegador. Cavaleiro da Casa Real, mas, como muitos outros, a sua fidalguia era circunstancial. Todos sabemos que Portugal, como reino pequeno e de população diminuta, para a grande tarefa dos Descobrimentos e levantamento do fabuloso empório comercial, facilitava a ascensão económica e social de muitos plebeus, Cristãos e não Cristãos, nacionais e estrangeiros.
 
Como tudo na vida, nada é perfeito, e, como justificando o secular adágio popular: “o hábito não faz o monge”, o nosso João de Belas meteu-se em trabalhos; foi apanhado a jogar as cartas, o mesmo será dizer: “na batota”, em sua casa, com outros indivíduos. Nessa época, na Lisboa quinhentista, o jogo das cartas e dados eram considerados vícios poucos cristãos e, como tal, crime, como referem as Ordenações Manuelinas, no título 48 - no Livro 5 - “como sam defesas as cartas, e dados”. A justiça régia não se fez tardar. Assim, o João de Belas perde metade da sua casa (a mesma onde se reuniam para a jogatana, Jorge Annis, Joham Afonsso e Foyas Joham Anriiquiz) para o denunciante do crime, um tal Francisco Tavares, Moço de Câmara del-Rei, a quem D. Manuel fez Mercê. 


Devo dizer que, nos alvores e na primeira metade de quinhentos a vida na urbe lisboeta era febril e palpitante. A azáfama quotidiana, aos olhos de alguns, assentava numa inata propensão para a materialidade, para o apego às riquezas, aos bens “terrenos” e, até, à luxuria decorrentes do “relaxamento de costumes”. O facto, e a resultante atitude apreensiva de certos sectores da Sociedade coeva é perceptível, por exemplo, no Cancioneiro Geral de Garcia de Resende, nomeadamente nas Cantigas de Álvaro de Brito; ou no Livro de Posturas Antigas da Câmara Municipal de Lisboa. Neste último, “descobrimos” que, o tal, João de Belas não morava propriamente num bairro “in” da cidade; antes e pelo contrário a sua rua, a julgar pela postura municipal, contida na folha 21 e com o título: “das molheres que fezerem por mays homens que por dous”, ficamos a saber que era o, ou um, dos locais da cidade de Lisboa onde a prostituição, no século XVI, era consentida. Será caso para dizer: “Fogo ao pé de palha o diabo lhe sopra.”





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