domingo, 16 de junho de 2013

Evocando Leal da Câmara- de Pangim à Rinchoa



ANTÓNIO LUÍS LOPES

Tomás Júlio Leal da Câmara nasceu em Pangim, Índia Portuguesa, no dia 30 de Novembro de 1876 e faleceu em 21 de Julho de 1948, aos 72 anos de idade, na Rinchoa (Freguesia de Rio de Mouro - Sintra).

Desde cedo se destacou como pintor e caricaturista mordaz, forma de expressão através da qual, enquanto Republicano de gema, combateu os excessos, misérias sociais e hipocrisia da Monarquia da época e da Igreja Católica que lhe dava suporte fundamental. Foi sem qualquer espécie de contemplação que Leal da Câmara deu expressão a esse combate, com participações em jornais da época como A Corja, A Sátira, O Diabo ou A Marselhesa.

Considerado “inimigo da Coroa”, viu-se forçado a exílio no estrangeiro (Espanha, a que se seguiu França e, finalmente, a Bélgica), o que veio alargar o seu reconhecimento internacional, nomeadamente pelas suas caricaturas no conhecido jornal L´Assiette au Beurre.

Foi grande amigo do poeta nicaraguano Ruben Dario (pseudónimo de Félix Rubén García Sarmiento), um dos “pais” do modernismo na literatura hispano-americana. Dario escreveu, entre outros, o famoso poema “A Roosevelt”, onde invectivava o Presidente norte-americano:



“Es con voz de la Biblia, o verso de Walt Whitman,
que habría que llegar hasta ti, Cazador!
Primitivo y moderno, sencillo y complicado,
con un algo de Washington y cuatro de Nemrod.
Eres los Estados Unidos,
eres el futuro invasor
de la América ingenua que tiene sangre indígena,
que aún reza a Jesucristo y aún habla en español.

Regressado a Portugal após a Revolução do 5 de Outubro de 1910, Leal da Câmara fixou-se no Porto, onde promoveu, entre outras, a célebre exposição do Grupo dos Fantasistas, no Palácio da Bolsa, em 1915. Enveredando pela carreira de professor a partir de 1919, dividiu-se entre o Porto e a capital enquanto docente de várias cadeiras de Desenho e Artes Decorativas.

Em 1930, com 54 anos de idade, Leal da Câmara foi residir para a Rinchoa (aliás, para o Estado Livre da Rinchoa, como ele fazia questão de dizer!...). A casa que adquiriu ( e que hoje constitui a Casa Museu Leal da Câmara) fora em tempos uma estação de muda de cavalos e pertença do Marquês de Pombal. Leal da Câmara fez as obras necessárias e adaptou-a para residência e atelier até ao fim dos seus dias.
As suas aguarelas e desenhos sobre figuras e tradições populares da zona saloia perduram até aos dias de hoje e, para além da excelência artística, constituem testemunho de inestimável valor sociológico e antropológico sobre aqueles a quem Raul Proença assim caracterizava em 1924, no seu Guia de Portugal:
 “Quando Afonso Henriques tomou posse de Lisboa, consentiu-se ao mouro que refluísse para os subúrbios da cidade, e ele aí se estabeleceu, entregue ao cultivo das hortas, com a água a escorrer da nora generosa. É desta população consentida, mourisca e subalterna que deriva o mais da gente que habita os contornos de Lisboa – o saloio de tez morena, pele tisnada, olhos e cabelos negros ou castanhos, membros secos, tipo sem finuras de raça e beleza plástica de linhas, tão afastado da gente bela e robusta do Norte, como o berbere dum dos melhores rebentos da gente circassiana”

1 comentário:

  1. Muchas gracias. Acabo de ver sus caricaturas en la exposición de la Fundación Lázaro Galdiano de Madrid. Câmara es auténtico como artista y como caricaturista.

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