Olhando
a imensidão e profundidade das montanhas, caio em mim e sinto-me insignificante
face aos fenómenos naturais.
Estas
massas enormes foram e continuam a ser moldadas pela natureza ao longo dos
séculos. Perante a sua idade a minha existência nada é, contudo, sou
suficientemente teimoso e quiçá estúpido ao querer e insistir em transformar e
domar estes corcéis altivos, rudes mas simultaneamente belos ao olhar. Olhar
que não cansa face à diversidade morfológica e às tonalidades obtidas.
Na
alta montanha a cor do céu está constantemente a mudar. As nuvens correm
tingindo de cinza os penedos. Num repente abrem e noutro repente fecham
refulgindo os cabeços, onde ainda se avistam restos de gelo resultado do
inverno recente, pois as neves mais brancas e macias há muito se foram liquidas
encosta abaixo a correr nos rios que passam nos frescos e arborizados vales.
Eis que de repente o cabeço se avermelha semelhando
sangue escorrendo pelas suas encostas, resultado único e inolvidável do sol
coberto pelas nuvens ao incidir no seu cimo. As nuvens até então cor cinza
deixam ver agora pinceladas de vermelho numa tela multicolor. Rapidamente
preparo a minha máquina de registar os momentos e obtenho uma magnífica
fotografia para poder contar e mostrar aos amigos.
Volvidos breves momentos, o vermelho deu rapidamente
lugar ao cinza. Acabara de viver e registar um momento pouco comum e nem sempre
observável, só possível em alta montanha, onde tudo é imprevisível e acontece
em rápidas fracções de tempo. Tempo que é aquilo que alguém em período de
descanso e ainda por cima já reformado do seu quotidiano trabalho, tem que
sobeje, para ficar a olhar para tudo e para o nada, o que é algo que vai
acontecendo com maior frequência. Deixamos o cérebro relaxar e divagar. Ficamos
com o olhar fixo e aparentemente parado. Só o cérebro continua a sua função e
vai destrinçando e ordenando a multiplicidade de pensamentos que vão correndo e
desfilando na nossa mente.
O sol apressava-se para ir dormir, ou mais
correctamente para ir banhar de luz e de calor a outra metade do planeta, pois
o sol nunca dorme nem descansa para nosso conforto e bem estar. O céu
apresentava-se vestido de nuvens cinzentas esparsas, deixando antever algumas
manchas azuis.
Recolho ao meu refúgio antes que a noite se encerre
sobre si, até porque uma fria aragem vem descendo do alto da montanha,
arrastada por uma suave camada de nuvens, vulgarmente conhecida por nevoeiro.
Opto por encerrar as janelas não vá o vento fazer uma partida. Por outro lado
reduzo a exposição ao frio, e a probabilidade de precipitação em alta montanha
é muito frequente, mais valendo prevenir do que remediar.
No aconchego dos meus aposentos, ao abrigo da
intempérie, e ouvindo o passar do vento roçagando nas paredes sento-me
comodamente após colocar um cd no prato da grafonola, a curtir alguns momentos
musicais de todos os tempos, e implicitamente do meu tempo, pois para tudo há
um tempo e um momento, e momento passado já não volta, já não é nem pode ser
como foi. Daí por vezes a nostalgia que nos assola, e a recordação do que foi e
já passou, e que de vez em quando insistimos em trazer ao nosso imaginário,
forçando a mente a levar-nos nessa viagem de recordações, embora por breves momentos
nas asas do tempo. Por vezes ficam apenas os testemunhos como o daquela foto
que obtive há pouco, e que simboliza algo que irei mostrar e rever com carinho.
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