terça-feira, 12 de agosto de 2014

No café

ANTÓNIO LUÍS LOPES












nada esperes. na mesa em frente ele levanta-se,

ela permanece, depois ele regressa e ela parte,

não aguardes compreensão, não escutes a porta

a bater. nada desejes. trazes esse cão negro da

ansiedade pela trela mas é ele quem te guia, ao

balcão alguém pede um café, a manhã passa,

a vida passa, a rua passa, lá fora a sombra passa

mas nada esperes, o que te prometeram foi

anzol, o que te mostraram foi ilusão, quebra-se um

copo na cozinha e há um riso de cacos no ar.



andamos há quarenta anos nisto, acorda, acorda,

não sei se ouvi num sonho ou foi agora,

nada é certo, nada é nosso, nada nos mostra

a chave da paz que perseguimos. o cão negro rosna.

não queria perder a fé nos homens agora que a

recuperei de Deus mas todos os dias o sol ameaça

desaparecer de vez e é por isso que vivo no medo.

nada esperes, então. Iludiram-te. Enganaram-te.

Nunca é tarde para prender a trela àquele poste

lá fora. E ir embora.

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