Eu
choro e chorando as saudades vou lavando. E ao lavar as saudades mais depressa
as esqueço. Esquecendo as saudades, mais tempo tenho para pensar em ti.
Pensando em ti maior a tua presença junto de mim na tua ausência. Se penso em
ti, não estás ausente. Estás aqui ao pé de mim, ao alcance de um afago, de um
sopro. Basta o querer. Querendo a nossa imaginação transporta-nos para longe.
Leva e trás o desejo. Com o desejo vão-se as saudades e com elas, as lágrimas
que chorei quando te tive nos meus braços. Abraçados alcançámos o porvir e
entrámos noutra dimensão. Aí ambos deixámos de existir para passarmos a
coexistir. Nesse patamar de existência deixamos de usar as palavras. As
palavras são fáceis de dizer, fáceis de incorretas interpretações. As palavras
são meramente palavras que deixamos de ouvir e que interpretamos como queremos,
e mais como nos convém.
Abaixo
as palavras e os palavrosos papagaios palradores semelhantes a ratos
guinchadores.
Limpemos
a mente como quem limpa uma lente suja de passado. Saibamos deitar fora os
discos riscados e de velhos sons empoeirados e borolentos. O bolor pode
tornar-se virulento e particularmente contagioso. Abaixo os passadores de
falsas ideias e de preconceitos recalcados. Calquemos nos vampiros e nos cabeças
de chicharro em decomposição. Saibamos compor a música das nossas vidas.
Embalemos os nossos desejos como se faz a um bebé. Sejamos crianças para todo o
sempre. Saibamos manter viva a criança que há dentro de cada um de nós.
Soltemos esse choro inocente e verdadeiro. Construamos o dia a dia de verdades
aceites e não consentidas e muito menos impostas. Saibamos correr com os
impostores e oportunistas, sanguessugas e parasitas. Eliminemos os vermes que
tudo contaminam e deitam a perder. Digamos não à ganância e ao oportunismo.
Saibamos construir as nossas próprias oportunidades alicerçadas no nosso saber
e na partilha de experiências. Experienciai as várias hipóteses que vos surgem.
Não vos escondais atrás de falsos saberes ou de doutores do templo, que vomitam
osgas e lagartas como quem come uma fatia de pão barrada com doce acabado de
fazer pela nossa avó. Aquele ser mítico e único, para quem poucas serão as
palavras de agradecimento pelo bem que souberam espalhar. Espalhai essa alegria
de viver. Contaminai as gerações vindouras desse saber e saber estar. Esse
saber estar aprende-se, pratica-se, cultiva-se e transmite-se.
É
precisamente neste ponto, aqui, que tu entras e estás, minha avó, mãe e amada.
São para ti estas palavras onde a palavra saudade não existe, porque tu existes
sempre dentro de mim.
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