quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

O legado de Mandela

RENATO EPIFÂNIO

Não parecem ser frequentes as situações em que a elevação ética coincide com a racionalidade político-económica – às vezes, parece até que estas duas posições são por inteiro incompatíveis. Vem isto a propósito do líder histórico da África do Sul, Nelson Mandela. Na sua morte, ele tem sido sobretudo elogiado pela sua elevação ética – em particular, na sua relação com a minoria “branca” sul-africana. E todos os elogios que se lhe possam fazer nesta área não são demais. 
Aqui, porém, vamos elogiar Mandela pela racionalidade da sua posição político-económica. Com efeito, ao não se ter vingado da minoria “branca” sul-africana, como muitos dos seus camaradas reclamaram, Mandela preservou a viabilidade política e sobretudo económica do seu país. Ao contrário de outros líderes africanos que cederam a essa tentação e, com isso, desmantelaram as alavancas maiores das economias dos seus países – lembre-se o caso exemplar do Zimbabué de Robert Mugabe –, Nelson Mandela percebeu bem que expulsar a minoria “branca” (ou “atirá-la para o mar”, como ainda hoje se ameaça) seria suicidário no plano económico. 
Não é pois por acaso que, não obstante todos os seus graves problemas sociais, que se mantêm, a África do Sul continua a ser o país mais economicamente pujante daquela região. Ao contrário de outros países – incluindo, é bom não esquecê-lo, algumas ex-colónias portuguesas –, a África do Sul percebeu bem que um regime democrático deve distribuir o mais justamente possível a riqueza criada. Mas, para que tal aconteça, importa primeiro que se crie riqueza. Só se pode distribuir o que existe. Não o que se destrói, por muitas (justas) razões que se tenham para tal.

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