Em nome do Pai e do
Filho e do Espírito Santo. Amen. Aprouve-me, a mim Afonso, Rei dos Portugueses,
filho do Conde Henrique e da Rainha Teresa e neto do Rei Afonso o Grande, e à
minha mulher, Rainha Mafalda, filha do Conde Amadeu, dar-vos, a vós que
habitais em Sintra, da classe superior ou da inferior e de qualquer ordem que
sejais, e a vossos filhos e descendentes, carta irrevogável, de direito,
estabilidade e serviço.
Em primeiro lugar,
damo-vos trinta casais com suas fazendas em Lisboa, a vós trinta povoadores que
ao presente povoais aquele castelo, a fim de que os tenhais, tanto vós como
vossos filhos, por direito hereditário, e por eles não pagareis qualquer
tributo em Lisboa, mas apenas no vosso castelo. E se vos aprouver pôr
trabalhadores nesses casais, não pagarão eles tributo algum a não ser a vós
donos dos casais; e se tiverdes ou comprardes alguma herdade em qualquer terra
do rei, tê-la-eis pelo foro de Sintra.
Nunca nos dareis
parte em qualquer seara.
Por homicídio,
violação de mulher e esterco posto na boca, pague o que tais crimes cometer 10
morabitinos, metade para o rei, metade para o queixoso.
Mas se cometer
homicídio em ocasião que homens bons o vejam, / ou pague o que lhe seria imosto
por crime de violação ou / pague exclusivamente o que for arbitrado pelos
homens bons.
Quem assaltar a casa
alheia pague 60 soldos, metade para o rei e metade para o queixoso.
Se o salteador,
porém, se apresentar com dois ou mais vizinhos que fiquem por ele
(comitantibus), mas nunca menos, os que a administrem a vila (illi qui
castellum judicaverint) não terão parte em qualquer multa.
Quem ferir outra
pessoa com lança, espada ou faca, pague cinco morabitinos, metade para o rei e
metade para o queixoso.
Quem se servir de
armas sem razão dentro da vila, perda-as; mas se a questão for admitida sob
fiança, não se julgue o pleito pelo foro de Sintra no que respeita ao elmo e à
loriga, mas apenas quanto ao escudo e à clava.
E não entre cá homem
de outra terra: tal o recado que mande, tal lho mandem a ele, igual por igual;
e seja a sua caução ou fiança de 1 soldo, se houver junta ou destrinça; mas só
se realizará prova testemunhal ou se remeterá a questão a juízo por valor
superior a 1 morabitino e abaixo de 1 morabitino nada se faça.
Quanto às demais
agressões, feitas à mão, a pontapé, à pedrada e à paulada e ainda em outras
queixas apresentadas, não se pague qualquer multa além das acima referidas.
Os agricultores
peões que lavrarem com um só boi paguem um sexto de trigo e de cevada, e se
lavrarem com dois ou mais entreguem um quarto, entre trigo e cevada, por
alqueire do mercado.
E paguem um puçal de
vinho a tirar de cinco quinais; e por qualquer outro trabalho (labore) nada
paguem.
Quem lavrar com
bois, não pague tributo por qualquer outro ganho que ganhar.
O caçador que
apanhar cervo ou cerva, ou caça no género, com laçou ou armadilha, entregue
meio lombo; se for porco, uma costa. O batedor de coelhos entregue uma vez por
ano, três coelhos com suas peles. O colhedor de mel selvagem entregue, uma vez
por ano, meio alqueire do que tiver colhido.
Paguem por ano: o
sapateiro 1 soldo, o ferreiro ferre um cavalo, o mercador e o peleiro 1 soldo
cada.
Aquele que viver
amantizado com mulher séria, segundo verificação e julgamento dos homens bons,
pague 1 morabitino.
Quando o homem
maninho morra sem filhos, devem [os do concelho] entregar os seus haveres aos
seus parentes e para bem da sua alma.
Se, porém, alguém
for condenado por furto, o dono dos bens recebê-los-á a dobrar, sendo a sétima
parte para o príncipe régio.
Quando morra
qualquer homem ou mulher, nada pague a sua família e recebam todos os seus bens
os seus parentes.
Quem quer que viva
no concelho [Sintra] há mais de um ano poderá vender os seus bens de herdade a
qualquer vizinho.
Quem não tiver bois
e lavrar na sua herdade com bois alheios de outro lugar pague foro somente ao
seu vizinho.
O mercador de Sintra
não pagará portagem em toda a terra do rei, quer vá vender quer comprar.
Se alguém levar
mandado do concelho ou for apresentar queixa ao rei seja alimentado no paço
real.
Os cavaleiros devem
combater uma vez por ano no exército do rei, para terem o seu estipêndio; mas o
rei nada receberá deles. Se não quiserem ou não puderem sair em fossado, nada
paguem. No apelido contra cristãos, saiam por maneira que possam regressar a
casa no mesmo dia; porém, contra pagãos, farão tudo quanto puderem.
Quando alguém puder
ter servidores, no castelo ou fora das muralhas, em herdade sua e habitando em
sua casa, o tributo só lhe será pago a ele, dono da herdade.
Quando um cavaleiro
morra deixando mulher, fique ela na condição de cavaleiro, enquanto se mantiver
viúva.
Se o cavaleiro
perder o seu cavalo, continue na sua classe durante cinco anos; depois, se não
quiser ou não puder ter cavalo, passe à classe de peão.
Entretanto, se algum
dos peões puder adquirir cavalo passe à classe de cavaleiro.
Os filhos de
cavaleiro ou peão, enquanto se mantiverem na herdade do pai, morto ou vivo,
sejam solidários: um por todos no cumprimento das obrigações comuns.
Se alguém tiver
contenda com habitantes de outros lugares e, tendo pedido justiça ao tribunal,
se apoderar de qualquer penhor sem o ter requerido, restitua o penhor a dobrar,
embora depois venha a ser condenado.
Se qualquer
indivíduo tiver lide (intencionem) com homens de fora, ou acordar julgamento
com eles, verifique-se este junto às águas correntes do seu castelo, sendo os
juízes que julgarem a contenda (intencionem) metade de uma parte e metade de
outra.
Se alguém não
comparecer no tribunal para responder à acusação que lhe façam, o saião irá
penhorá-lo e tomar conta do penhor, mas nunca deverá selar-lhe a casa.
Se o juiz ou o saião
for espancado ou ferido em questão pessoal e não em serviço do príncipe, a
multa, nesse caso, será igual à de qualquer outro. Se o juiz for ferido em
serviço do príncipe, reverterão dois soldos para o saião e um soldo para o rei.
O juiz e o saião
serão escolhidos de entre os naturais, entrando e saindo por mão do conselho; e
nunca vos será imposto juiz nem saião de outra terra.
O juiz receberá a
décima parte do príncipe em toda e qualquer multa e o saião receberá a décima
parte do juiz.
Quem ferir ou
espancar outra pessoa receberá dez varadas e porá a mão por terra; e a seguir
dará satisfação judicial àquele que agrediu, segundo o seu foro.
Os cavaleiro que
avistem inimigos do rei, pagãos ou cristãos, dispostos a fazer mal, devem ir
com mandato a Lisboa, mas não mais longe; e por outro motivo nem peões nem
cavaleiros executem mandato.
Os militares ou
peões que saírem para terra alheia serão coutados, e ninguém lhes lance mão
para lhes fazer mal, seja qual for a causa; e quem os prender ou derrubar do
cavalo pagará cem soldos e depois indemnizá-los-á com o dobro do que eles
pedirem na demanda. E se os prejudicar nos seus haveres, indemnizá-los-á com o
dobro, como nas demais causas.
Aquele que brigar
com armas (homo firidore) e, tendo ido a tribunal não se emendar ao fim de três
vezes, e bem assim o libertino (cusculator) que não se queira emendar segundo o
foro de Sintra, terão as casas derribadas.
No foro de Sintra
haverá seis juízes no julgamento do homicídio; em qualquer outro julgamento
bastarão três homens; e nunca haverá mais do que no julgamento de homicídio.
Os cavaleiros de
Sintra devem testemunhar no castelo como quaisquer cavaleiros do território do
rei, do mesmo modo os peões (pedites similiter).
Os cavaleiros de
Sintra que prestarem bom serviço ao seu alcaide receberão dele uma boa dádiva
uma vez por ano.
O homem que quiser
receber mulher com autorização de seus parentes (per mandatum de suos parentes)
dê-lhe como dote seu uma saia, um par de sapatos, uma cinta, e ainda 50 soldos
como garantia de futura bênção. Mas se depois se arrepender, perca tudo quanto
deu, incluindo a garantia paga. E se a mulher, por si ou por seus parentes, se
arrepender ou recusar, restitua tudo quanto recebeu, e depois a garantia em
dinheiro.
O homicida e o
foragido que se refugiarem no concelho serão admitidos, e do mesmo modo o
servo, salvo se for do rei.
Os clérigos terão
condição de cavaleiros. O clérigo será natural [morador arreigado] e, pelo foro
de Sintra, nunca perderá a sua igreja; tê-la-á por direito hereditário e só a
perderá por delitos que o obriguem a depor as ordens, mas nunca pelo poder de
qualquer pessoa, nem do rei nem do bispo.
E nós, moradores do
sobredito castelo, por este bom foro que o nosso rei e sua mulher nos
concederam, prometemos-lhes fiel obediência para sempre, e contra os seus inimigos
empenharemos as nossas pessoas e bens.
E se vier tempo em
que o rei se decida a povoar os referidos arrabaldes, aqueles que então morarem
no castelo receberão cada um seu casal com suas herdades.
Os clérigos de
Sintra devem servir o seu bispo e terão alimento em casa dele. E o bispo
dar-lhes-á uma boa dádiva uma vez por ano.
Era Mª Cª LX’ª II [nota: Segundo Alexandre Herculano, o X
aspado (X') significava XXXX. Equivalendo a Era Hispânica a menos trinta e oito
anos, temos então que 1192 é aos olhos de hoje, 1154 d.C].
Eu, Afonso, por
graça de Deus rei portugalense, junto com minha mulher rainha Mafalda.
Corroboro + e confirmo + esta carta. E se alguém, inclusive nós próprios,
quiser desfazer este contrato, indemnize (pariat) com 500 áureos e com Satanás
seja excomungado.
Sejam, pois, os
limites desse território (ejus terre), para lavrar e plantar: desde Almosquer,
pela vertente vai pelos outeiros, servindo de limite o caminho público que
passa em Cabriz até ao monte e que dessa vertente vai pelos outeiros até ao
limite de Cheleiros de onde segue até ao rio em Galamares. E se mais crescerem
os habitantes (gentes), cresçam para eles os herdamentos, conforme aprouver ao
rei.
Testemunhas:
dapífero da cúria Fernandes Captivus, Pelagius Zapata, Gunsalvus de Saussa,
Petrus Fernandiz, Dominicus Valascus, Gunsalvus Rodriguiz, Menendus Moniz,
Laurencius Venegas, Sancius Moniz Egeas, arcediago da Igreja de Lisboa. –
Confirmo este contrato: signífero Petrus Pelagii. Príncipe de Lisboa, Alfonsus
Menendi, confirmo. Príncipe de Coimbra, Ropdrigus Pelagii, príncipe de
Santarém, Johannes Ramiriz, confirmo. Mestre Alberto, notário do rei, escreveu.
– Seguem-se os sinais de Alfonsus, rei portugalense, rainha Mafalda e mestre
Alberto.
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