O
que é adiado? É aquilo que se anseia alcançar, e apesar de todos os esforços e
desejos não se almeja. E não se almeja porque não depende de cada um de nós
isoladamente, mas exige percorrer um caminho lado a lado, exige um contributo colectivo
e livre, límpido e puro.
Num
país ou numa sociedade tudo é socialmente adiado. Adiado porque protelado.
Adiado porque justificado sem justificação alguma. Protelado porque são esses
os objectivos de quem protela, de quem arrasta no tempo as decisões, com
argumentos fúteis e balofos. Adiado e protelado porque é nesse sentido que toda
a política social e de distribuição da riqueza funciona e caminha.
Arrastado
no tempo porque é a única forma de continuar a governar e mandar, com base nas
sucessíveis promessas não cumpridas, que constituíram o cerne de toda a questão
a adiar. E quando se adia, tal é feito com o argumento de que se trabalha para
o bem comum e colectivo. Que esses são os desígnios nacionais, e que os mesmos
contribuem para o bem estar social do povo, e que são necessários ao equilíbrio
financeiro das contas do país.
Adia-se
porque adiar faz parte da tradição histórica e cultural do país. Protela-se
para que tenhamos sempre quem nos venha lamber as mãos, quando não as botas.
Arrasta-se porque é a única forma de se manterem as pessoas humildes e
submissas, esperançosas na alteração, nas mudanças, no finalmente, numas
migalhas sempre bem vindas e melhores do que coisa nenhuma.
O
meu país é um país adiado, porque adiadas são as esperanças, as verdadeiras
reformas sociais, o bem estar físico e social, o futuro, as gerações vindouras.
O
meu país sempre foi um país adiado, com fortes índices de pobreza social e
cultural. Com fortes taxas de analfabetismo e de emigração.
O
meu país por momentos parou, reflectiu e repensou, mas passados os primeiros
deslumbramentos voltou a ser um país adiado. As promessas esvaíram-se. A
emigração regressou, e com ela o desemprego e a miséria.
O
meu país voltou a ser um país adiado, na cultura, na educação, na saúde. Mesmo
para os que arrastam e mantêm esse adiamento. Porque continuam a ser iguais a
si próprios, na sua pequenez e no seu não fazer. Continuam a arrastar o meu
país, contribuindo para que o mesmo cada vez seja mais adiado.
Nem
se apercebem que eles próprios são peças adiadas que fazem parte deste mesmo
país social e culturalmente adiado.
O
meu país é um país adiado, adiado e esperado, por vezes desesperado, porque
esperam os deficientes, os invisuais, os velhos e os novos, os desempregados e
os com emprego, os enfermeiros e os professores, os comerciantes e os
pescadores, os transportes e os agricultores, os médicos e os solicitadores, e
os militares.
Todos
esperam e desesperam, menos os políticos, pois deles nada se espera, logo não
são esperados. Esses bem que podiam ser adiados e protelados, e nas prateleiras
arrumados. Arrumados porque antiquados, porque desajustados. Arrumados porque
fora de tempo, descontextualizados. Esses podiam ser eternamente adiados. O
povo agradecia, e só dessa forma deixaria de ser adiado.
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