Num dia de morte nasceu um beijo. E
porque um beijo não o é sem destinatário, a queda da folha anuncia um desejo
incomensurável de vida: sentir...
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o
Mundo!...
Pelas voltas que o Planeta orbita em
torno de si, milhões de beijos ainda ingénuos eram lançados à vida deste
Planeta. Mas na translação à Esfera termonuclear, os beijos iam tendendo para a
nulidade...
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o
Mundo!...
Ósculo sabia do privilégio com que o Ser havia sido dotado: os cinco
sentidos. Todo o Ser, animado ou não, haveria de ter a capacidade de oscular.
Mas apenas os humanos a aperfeiçoaram e, destes, por compreensão, alguns
eternizaram o seu efeito. Outro “mas”, contudo, negou a todos a verdadeira
essência do conjunto do que é um beijo: a sua visão e consequente revisão para
que se possa existir em perfeição.
Representações, símbolos, silhuetas foram elaboradas em embaixadas do “beijo”,
mas ninguém conseguia ver o “beijo”, muito menos o seu próprio no devido momento
da sua materialização.
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
Procurou pelo tempo que se concebe à evolução das possibilidades e
reparou que havia um ponto em que o homem reunia num curto espaço, quatro dos
seus sentidos: a cavidade bucal.
Se o Ser humano capta a sua realidade através das sensações, nada como um
ponto de ligação onde se exerça o contacto inicial. Com o paladar e o cheiro, o
tacto e o som de um beijo, um elemento, misterioso e alheio à tabela periódica
dos elementos conhecidos pelo homem, daí resultava. Tão poderoso como o
Hidrogénio, mas escuro e milagroso quanto ingénuo...
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
Duas dificuldades foram apresentadas ao Ósculo: como arquitectar forma ao
beijo; torná-lo presente e material, a fim de ser sentido e deste se servir
como requisito.
Um segundo obstáculo, bem mais complicado e derivado da primeira
dificuldade, era o beijo poder ser visto por todos. A visão apenas captava a
união dos seres em causa e relatava os feitos grandiosos, em memória, que ele
sempre produziu na História...
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
O Beijo, de que o Ósculo somente era estruturado, é um processo de
simples aritmética. Num ponto, multiplicam-se sensações com a simples conexão
entre dois seres. E quanto mais intensa, enraizada e profunda, melhor a
eficácia...
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
O Ósculo resultou de uma reflexão imponentemente introspectiva e segura,
muito conhecida e pregada pelo próprio na busca e exploração de uma cor.
Dizia ele:
“A distância entre galáxias, entre planetas e estrelas, ou simplesmente
entre todos os astros, é equivalente à distância entre os humanos: existe uma
força gravitacional que os separa. É provisoriamente certo que o Universo está
em expansão, com um espectro a tender para o escarlate da longevidade. É
preciso encontrar o violeta da proximidade.”
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
E ao processo geométrico da sua invenção, deu-lhe o nome homenageativo de
Osculação; o contacto entre duas superfícies que se interessam; o brotar de
vida pela relação dos elementos conjugados em complexos biológicos
potencialmente perfeitos pela evolução contínua...
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
Somente na entrada de um Outono, com a necessidade de contrariar “a
queda”, a fértil ideia primaveril do Ósculo insurgiu-se para acalmar a longevidade
escarlate dos homens; pois que, ao longo dos anos, iam escasseando os ósculos
sentimentais; de beijos verdadeiros no desejo e honestos na intenção.
... Tarefa árdua do Ósculo: beijar o Mundo!...
E o Beijo começou a desviar-se do seu rumo: deu-se a coisificação do
Beijo. Beijos maus, a sua comercialização e beijos falsos intensificaram-se,
não só pelo aumento quantitativo da sua utilização, mas na qualidade dos
objectivos épicos do processo de Osculação...
... Tarefa infrutífera do Ósculo: beijar o Mundo!...
De tanto deambular pelo Mundo, o Ósculo desistiu espiritualmente –
sendo-lhe impossível interromper-se fisicamente -, porque ninguém conseguia ver
o beijo. O homem havia transformado e/ou trocado a sua cura, ou, tratamento,
pela doença. Ósculo iniciou um processo, mas incompleto por um sentido...
... Tarefa ingrata do Ósculo: beijar o Mundo!...
Mas foi num dia de Outono em forma de intenção primaveril que ele se ergueu
novamente. “A queda” iniciou-se verdadeiramente com um encontro.
Concentrou os esforços...
Ósculo nunca se tinha dado a si próprio ao seu processo. E um Ser houve que lhe despertou a vontade de ser
aquilo para que se criou. Um Ser que fez criar mais um emblema na Tabela para o
elemento escuro: o Beijo, de número atómico inesgotável, mas de peso limitado
na balança existencial; o elemento Zero (0)...
Ósculo viu o Ser e fez-se oscular... e o beijo pôde Ser visto...
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