Sintra,
23 de Dezembro de 1928.
Decorreu
no campo dos Seteais, um desafio de futebol, num campo parte integrante da
Quinta do Conde Sucena, que cedia aos clubes de Sintra o espaço fronteiro ao
seu Palácio para a prática do futebol.
Na época haviam dois clubes na Vila, o Sintra
Football Club, e o União Sportivo de Sintra. Da Estefânia, o Sport União
Sintrense e o Sport Lisboa e Sintra, de São Pedro, a Sociedade União 1º de
Dezembro. Havia ainda o Operário de Sintra, originário da Tuna Operária de
Sintra, mas não sei se chegaram a jogar nos Seteais.
Naqueles tempos, os jogos tinham sempre um
troféu em disputa, neste caso, num desafio entre o União Sportivo de Sintra,
capitaneado por Américo Faria, e o seu maior rival o Sport União Sintrense,
capitaneado por José André, considerados pelo repórter da época como os mais
fortes grupos de Sintra, o troféu foi designado como “um artístico bronze”. Reza a crónica que os “Velhos Rivais”,
levaram aos Seteais um grande número de ferrenhos adeptos, que durante o jogo
se manifestarem “claramente”, tal o
entusiasmo que estavam possuídos, (palavras do repórter), porrada de criar
bicho, depreendo eu.
O jogo
foi arbitrado pelo Senhor Adriano Resende, de novo convidado para arbitrar, “viu com aquela facilidade filha da
competência” NR.(*)
O jogo
foi de uma rijeza tal que o árbitro teve que fazer vista grossa a muita coisa,
e teve que ser muito paciente, e surdo para as claques e cego para as cores em
campo. NR
Começa o
jogo. Não esquecer que estávamos em Sintra no dia 23 de Dezembro de 1928, pleno
Inverno, diz a reportagem que, o tempo se cerrou por completo, mal os jogadores
se viam uns aos outros. O Senhor árbitro queria adiar o jogo, aconselhando que
não se devia continuar a jogar! Qual quê vamos a isto que é uma pressa, “não quiseram”, diz o relator.
Como a
violência é inimiga da boa técnica, foi um jogo todo de peripécias, cujo
epílogo representa vergonha trazer-se a lume. Mas eu trago, porque além de
ainda não ser nascido, sei o epílogo.
A porrada
começou dentro do campo, tendo acabado cá fora, com as duas claques, que
estavam uma de cada lado da linha lateral, a invadirem o terreno de jogo. Foi
uma autêntica batalha campal, em resumo, o costume nestes jogos.
Por estas
e por outras, o Conde teve muita paciência, mas assim que pôde, correu de lá
para fora com estes espetáculos degradantes. O repórter, muito punhos de renda,
para não ofender nem gregos nem troianos, atenuou, dizendo que foi uma
vergonha, enfim, o que lá vai, lá vai fazendo votos que o brio desportivo nunca
abandone aqueles que prezam o seu nome e respeitam a sua colectividade. Um
Senhor, este repórter.
Refere a
determinada altura, o nome de CARLOS SANTOS, desportivamente, mais conhecido
por “CAÍNHAS”, o melhor homem em campo, no jogo supra citado. CAÍNHAS, o meu
falecido pai jogava no União Sportivo de Sintra (e também no Sintra Football
Club), União Sportivo, que neste jogo levou de vencida o Sintrense por 2-1,
sendo um dos golos de penalty, e o árbitro teve a coragem de anular um golo ao
Sintrense. Faço ideia, aquilo era uma guerra. Se alguém dava um espirro, com
estes ingredientes todos a alimentar a combustão, mesmo a chover, nada fazia
apagar aquele lume.
Diz o
repórter que o Sintrense não estava em Sintra. Toda a gente sabe que jogou mal.
O Sintrense era regularmente o campeão destes jogos, daí o repórter dizer, às
tantas, que estavam pouco habituados a perder, e que também é preciso “saber perder”. Refere ainda que a vitória
do União se deve ao bom trabalho de toda a linha e ao seu melhor homem, aliás
ao melhor homem em campo que foi “Caínhas” que “estava simplesmente colossal” NR É
um óptimo defesa. Abusa por vezes do seu físico, lançando-se com uma violência
que não é necessária” NR.
Eu
acrescento, era um poço de força, 1,80m, 80kg de peso, e uma vida de trabalho
duro, e com muita natação nas presas de Monserrate, desde menino, onde iam
tomar banho depois de grande parte dos jogos de futebol, a pé dos Seteais até
Monserrate, e depois a pé para a Vila, não havia cá frio nem distâncias
grandes, era tudo pujança, juventude, amor à camisola.
O meu pai
era um homem muito respeitado na Vila, e não só, tinha amigos em todo o lado.
Nunca esqueceu a rivalidade com o Sintrense, vá-se lá saber porquê, visto não
ser pessoa de rancores nem de ter inimigos, talvez por ser uma rivalidade tipo
Benfica /Sporting. A crónica diz também que os caseiros das quintas em redor,
roubavam as bolas, que lhes iam lá parar, o que deve ter dado grande falatório,
porque vem a desculpar-se e a tirar deste rol os “criados” da Quinta do Conde
Sucena, que foi o grande impulsionador do futebol em Sintra, não só cedendo
este espaço primitivamente, como mais tarde dando para os clubes de futebol os
terrenos onde se situa hoje o património do 1º de Dezembro.
Se
verificarmos as datas, isto era tudo como se fazia em Inglaterra, um autêntico Boxing Day, a terminologia do jogo era
exatamente igual, os livres eram – free
quick, penalty, corner, o team,
os defesas eram os back’s, médios half-back, o árbitro era o refe, para
simplificar o nome referee.
Na hora
do fecho do jornal onde saiu esta reportagem, tinha acabado um jogo entre o
Sport Lisboa e Sintra, e o União Sportivo de Sintra, ganho pelo Sport Lisboa e
Sintra por 3-2. Ora este jornal saiu no dia de Natal de 1928, e o jogo que foi
relatado jogou-se em 23 de Dezembro 1928, dois dias antes, tendo o União dois
dias depois jogado de novo. Para amadores, é obra, um verdadeiro Boxing Day do futebol local. Dá ainda
nota o Jornal que na quinta-feira, no Cine Tivoli haveria grande festa de
homenagem ao Sport União Sintrense, campeão local.
Artigo escrito a partir duma notícia do
jornal Sintra Regional de 25 de Dezembro de 1928, sendo redactor (NR) António
Medina Júnior.
Carlos Caetano dos Santos, meu pai, terceiro da esquerda para a direita na fila de baixo
Terceiro, na fila de cima. Equipa do Sintra Foot Ball Clube em 1930
Quinto, na fila de baixo
Carlos Caetano dos Santos, meu pai, terceiro da esquerda para a direita na fila de baixo
Terceiro, na fila de cima. Equipa do Sintra Foot Ball Clube em 1930
Quinto, na fila de baixo
Gostei muito deste apontamento. obrigada
ResponderEliminar