Em 1965, ao adoptar a
data de 8 de Setembro como Dia Internacional da Alfabetização, a UNESCO logo
estabeleceu que, para a eficaz e sistemática divulgação das campanhas afins de
cada ano de trabalho neste domínio, todas as iniciativas se subordinariam a um
tema específico e dinamizador.
Foi nesse contexto que, apenas referindo os três anos mais
recentes, em 2012, a ideia forte foi a da Alfabetização e Paz enquanto que, no
ano passado, a linha mestra de todas as grelhas de actuação passou por
perspectivar os desafios de uma adequada Alfabetização para o Século Vinte e
Um. Pois bem, em 2014, a grande preocupação é Alfabetização e o Desenvolvimento
Sustentável.
De algum modo,
através da simples enunciação deste tipo de slôganes, a UNESCO chama a atenção
para um factor determinante. Ou seja, longe de se reduzir à mera dicotomia
ensino/aprendizagem de um código alfanumérico, a alfabetização é indissociável
dos mais ambiciosos objectivos sociais, económicos e culturais que contribuem
para a hipótese da felicidade do Homem.
O tema condutor deste
ano não podia estar mais de acordo com o global entendimento da alfabetização,
não como oferta ou imposição do sistema mas, isso sim, tal como Paulo Freire
propunha, aquisição-chave para o indivíduo se tornar cidadão em toda a acepção
da palavra, com plena capacidade de intervenção cívica, sempre na perspectiva
de que ela não transforma o mundo mas muda as pessoas e estas é que transformam
o mundo.
Ora bem, tal conceito
radica na constante necessidade de actualização de um programa cujas
características estruturais exigem logística adequada em todas as latitudes,
considerando que, tanto as grandes manchas continentais como as bolsas mais
restritas de analfabetismo, sempre correspondem a evidências de
subdesenvolvimento, ainda que com os matizes naturais e correspondentes às
respectivas coordenadas geográficas e socioculturais.
Preocupantes números
Na ponta mais meridional da Europa, quando nos esforçamos
por melhor entender o caso português, logo deparamos com um quadro cujos
contornos, além de negativos, se evidenciam com assinalável persistência. De
facto, que evolução poderá ter existido se, em 1900, cerca de setenta por cento
da população era analfabeta e, três quartos de século depois, tal percentagem
era próxima dos trinta por cento?
Mais ou menos trinta por cento, em 1974? Será necessário
recordar que trinta por cento era a taxa de analfabetismo que países como a
Irlanda ou a Áustria apresentavam na última década do século dezanove,
praticamente cem anos antes?
No que respeita às tentativas de remediação da situação
depois do 25 de Abril, cumpre lembrar as generosas e inúmeras iniciativas de
alfabetização promovidas e protagonizadas, entre outros, por intelectuais,
professores, estudantes e militares dos três ramos das forças armadas.
Foi necessário,
contudo, aguardar cinco anos para que, por unanimidade, o Parlamento tivesse
aprovado a Lei 3/79 de 10 de Janeiro e, com ela, apresentasse o Plano Nacional
de Alfabetização e Educação de Base dos Adultos [PNAEBA] cujo Relatório de
Síntese, datado de Junho do mesmo ano, sistematizou e, grosso modo, apontou o
fim da década seguinte para irradicação do analfabetismo.
Foram investidos recursos muito significativos e montada uma
estrutura nacional, dotada dos indispensáveis meios materiais e recursos
humanos. Muito, muito se fez mas também muito ficou por fazer, razão pela qual
Portugal ainda é um país em que a Educação de Base de Adultos se impõe de modo
determinante.
Com uma preocupante incidência de mais de vinte por cento
dos cidadãos vivendo no limiar da pobreza e, pasme-se, com a mais elevada taxa
de analfabetismo de todos os países da Europa a 27, será que surpreendem as
marcas de subdesenvolvimento?
Aliás, para bem de todos, a verdade dos baixos índices
socioculturais portugueses deveria ser devidamente partilhada, tanto a nível
nacional como na UE. Ora bem, não é, está longe de ser e isso só prejudica o
país que, nem se mobiliza internamente nem é objecto da solidariedade europeia
na dimensão de que carece.
Finalmente, outra realidade não menos preocupante se vai
perfilando. Refiro-me à literacia cuja definição remete para as capacidades de
processamento da informação escrita na vida quotidiana. Trata-se das
capacidades de leitura, escrita e cálculo com base em textos, documentos,
gráficos, de uso corrente na vida social, profissional e pessoal.
Pois bem, importa
assumir que 47,3% da população portuguesa se distribui pelos níveis 0 (zero) e
1 (um), ou seja, correspondentes à mais radical indigência da literacia. São
números tremendos, quase metade da população!... Na realidade, o analfabetismo
surge com outros e radicalmente novos desafios aos quais preciso é responder,
quanto antes, integradamente, com todos os recursos disponíveis.
Naturalmente, em Sintra, esta estatística também dá que pensar.
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