terça-feira, 3 de junho de 2014

Estacionamento em discussão pública, movimento cívico em acção

JOÃO CACHADO

Trata-se, sem a menor dúvida, do assunto que mais intervenção cívica me tem determinado ao longo de anos e anos de escrita na imprensa regional e nas redes sociais. Questão transversal, cujas plataformas de abordagem se cruzam, na maior intimidade, com uma miríade de problemas, também ainda por resolver, a resolução do problema do estacionamento é absolutamente crucial.

Ultrapassando o perfil daquela minha atitude interventiva que, à excepção da luta contra a instalação de um parque subterrâneo de estacionamento na Volta do Duche, tem sido mais pessoal, proporcionou-se agora a possibilidade de trabalhar na análise do Projecto de Alteração ao Regulamento de Trânsito e Estacionamento do Município de Sintra, aprovado em 23 de Novembro de 2011, no âmbito da União das Juntas de Freguesia de Sintra. Fernando Cunha coordenou o grupo que integrou Sofia Dionísio, Rui Bernardo, João Dinis, Ricardo Duarte e eu próprio, enquanto membros activos de movimentos cívicos que, tanto em São Pedro como na Estefânea, vão dando passos certos e interessantes. 



Intróito

Começámos por apresentar uma Introdução em que, desde logo, se nos revelou que o documento em apreço focaliza toda a atenção na possibilidade de colher o máximo proveito das cobranças inerentes ao parqueamento pago, reforçando e alargando zonas, principalmente, quer na sede do concelho quer nas praias, atitude que estará ferida de legalidade.
Com toda a pertinência, manifestámos a maior estranheza quanto ao facto de a Câmara Municipal de Sintra ter desperdiçado a oportunidade que se lhe oferecia na presente circunstância, no sentido de propiciar aos munícipes um documento de estratégia que visasse o equacionamento e a operacionalização de medidas afins da resolução de gravíssimos problemas de estacionamento na sede do concelho.

Também sublinhámos ser cada vez mais problemática a situação gerada com o afluxo de viaturas motorizadas particulares ao centro histórico e pontos altos da Serra de Sintra, situação tanto mais contundente quanto se conjuga com práticas de designada tolerância das autoridades policiais que, cumulativamente, tiveram como visível consequência cenas que, de modo algum, se coadunam com a justa aspiração de Sintra a emparceirar com os destinos nacionais e internacionais mais sofisticados em termos da qualidade de vida dos residentes e condições de visita aos forasteiros.

Confirmámos como será sempre de acordo com uma perspectiva que privilegie a análise sistémica e uma subsequente intervenção integrada que, para os problemas do estacionamento, poderão encontrar-se soluções eficazes, civilizadas e expeditas, em articulação com problemas tão diversos mas confluentes, tais como o regime de cargas e descargas, sistema de transportes públicos, condicionamento de trânsito em determinadas vias e zonas, etc.

Tal como tantas vezes se tem evidenciado, nenhuma das soluções que convêm a Sintra neste domínio, constituirá qualquer novidade relativamente às que já foram concretizadas noutras latitudes, nomeadamente, nos contextos europeus que, por analogia de condicionalismos, por exemplo, geográficos ou culturais, enfrentaram e resolveram problemas semelhantes.

Parques periféricos e oferta integrada de transportes

Seguidamente, decidimos apresentar, ainda que, necessariamente, em termos muito sumários, um conjunto de propostas cuja concretização avaliamos como prioritária, já que o bem comum assim o determina, apesar de poderem gerar uma previsível controvérsia. É para o efeito que os decisores políticos dispõem da autoridade democrática conferida pelos votos dos cidadãos, através da implícita delegação do poder.

Não poderá constituir qualquer novidade que tenhamos proposto, como incontornável e inadiável, a instalação de parques de estacionamento periféricos, estrategicamente localizados, de dimensões variáveis, com inequívocas condições de higiene e segurança onde os utentes possam deixar as suas viaturas e, mediante tarifas diferenciadas, consoante percursos pré seleccionados e disponíveis, dirigirem-se aos seus destinos, perfeitamente descansados, com um título de transporte que inclui a tarifa do parqueamento.

É imprescindível entender-se que a solução parques dissuasores periféricos também resolverá o problema da impossibilidade de acesso de viaturas particulares aos pontos altos da Serra de Sintra. O património natural em questão não pode continuar sendo agredido pela poluição causada por milhares e milhares de automóveis. É por isso que se advoga a solução de voltar a encerrar a Rampa da Pena, apenas autorizando a circulação de transportes públicos e, pura e simplesmente, eliminando os parques de estacionamento que a PSML instalou junto ao Castelo dos Mouros, do Parque da Pena e do Chalé da Condessa.

Funicular e eléctrico

Assim sendo, inevitável se revela equacionar a solução do funicular, que opera muito discretamente, sem qualquer impacto ambiental, em carril adossado ao monte, cujo desnível é vencido em ambos os sentidos, ascendente e descendente, como acontece noutros lugares dotados de abundante património edificado, também classificados pela UNESCO como Património da Humanidade, lugares com a análoga característica de Sintra, em que a impositiva presença da montanha, no cimo da qual há pontos de inequívoco interesse a visitar, determina a adopção deste meio de transporte.

Ao tratar do caso do eléctrico, tivemos em consideração as Jornadas de Reflexão sobre a Estefânea, debate público promovido no Palácio Valenças em 22 de Março de 2004, durante as quais foi proposta a reabertura ao trânsito da Avenida Heliodoro Salgado, apenas no sentido ascendente, de tal modo que permitisse a concretização do projecto do seu renovado atravessamento pela linha do eléctrico, prolongando o percurso até à estação terminal da CP e à Vila Velha, tal como aconteceu em tempo remoto. Em sentido complementar, deveria também proceder-se ao prolongamento até às Azenhas do Mar.

Mais uma vez se repete que, resolvido o problema do estacionamento, nomeada mas não exclusivamente, através da instalação dos parques periféricos – já que importa manter bolsas de estacionamento de proximidade para residentes, comerciantes e alguns funcionários, em particular, de entidades públicas – é perfeitamente possível encarar esta solução do eléctrico. A sua compatibilização, aliás, pressuporá um elevado índice de condicionamento de trânsito na Volta do Duche, apenas permitido a transportes públicos, veículos dos serviços oficiais, prioritários, mercadorias para cargas e descargas, táxis, comerciantes e residentes locais e a jusante da Vila Velha, tanto no sentido de Colares como no da Serra.

Casos bicudos

A bolsa de estacionamento de proximidade, adjacente ao edifício do Departamento do Urbanismo, deverá merecer um particular cuidado por parte da autarquia já que, de acordo com a capacidade instalada, constitui o mais importante supletivo em relação ao limitado estacionamento nas imediações do Centro Cultural Olga Cadaval, Casino e Igreja de São Miguel, incluindo a garagem da EMES.

Além da requalificação do espaço - que não deverá suscitar a precipitada decisão de o transformar num parque pago - urge reinstalar a passagem aérea que permite o acesso pedonal, em ambos os sentidos, entre os bairros da Estefânea e da Portela. Por ocasião da realização de eventos de grande afluência no CCOC é indispensável contar com esta disponibilidade cuja divulgação também deverá ser encarada através dos meios mais eficazes.

Outro assunto extremamente preocupante, por resolver há muitos anos, é o da inexistência de um parque de campismo e de autocaravanismo para onde poderiam ser conduzidos estes veículos cujos condutores demandam, cada vez mais, os destinos sintrenses. Na ausência de espaços para o efeito vocacionados, tanto a autarquia como as autoridades policiais têm tolerado soluções, afinal, intoleráveis, bem patentes nas cenas de perfeito terceiro mundo em pleno centro histórico, suscitando sérios problemas sanitários e de segurança. Entretanto, na impossibilidade de resolução definitiva de tão melindrosa questão, sugerimos a utilização do espaço, para o efeito oportunamente criado junto ao estádio do Primeiro de Dezembro, que está dotado de infraestruturas mínimas e decentes.
    Foto Fernando Castelo
À guisa de conclusão, acrescentaria que os tempos de austeridade que atravessamos só podem determinar ainda maior contenção, cumprindo à autarquia dar respostas com a dignidade que Sintra merece, numa abordagem correcta, porque devidamente estudada, dotada dos meios apropriados, integrada e articulada. Nada é preciso inventar. Para ganhar esta luta contra o desleixo, pela disciplina e correcção do acesso ao centro histórico e aos monumentos, basta copiar o que acontece em certos lugares nacionais e estrangeiros para onde o cidadão sintrense não precisa nem deve olhar invejosamente.

[João Cachado escreve de acordo com a antiga ortografia]


1 comentário:

  1. Gostei da sua analise , é triste que a ponte que ligava a portela a estefanea ainda não tenha sido reposta , faz uma falta incrível.

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