Uma presença
institucional centenária provisória
Nas minhas andanças de investigação
literária e arquivística, tenho-me deparado com situações que, na sua
substância, na sua oportunidade ou no seu propósito, umas vezes aproximam-se
das realidades vividas no nosso tempo, outras vezes confrontam-nos com tudo
aquilo que, verdadeiramente, somos.
É natural que a observação do passado, feita
na perspectiva de interpretação do presente, tem de ser cuidadosa e admissível
de fragilidade, pois, independentemente, de podermos estar perante leituras de
simples coincidências de acontecimentos ou de casualidades provocadas por
razões semelhantes, não podemos deixar de questionar a influência dos condicionalismos
do espirito de época e das sensibilidades ideológicas das suas interpretações.
Sem querer fazer do tema abordado uma
prova da nossa caracterização de fracos organizadores e inconsequentes
planeadores da nossa vida, não posso deixar de apontar este exemplo, com a
solidez de interpretação obtida através dos documentos, como mais um apontamento
do ser português.
Sabemos através das actas das reuniões
da Câmara Municipal de Sintra, mais precisamente, do registo da reunião de 20 de Agosto de
1912[1], que foi
trazida à discussão da ordem de trabalhos um ofício/circular do Comando Geral
da Guarda Nacional Republicana, pedindo, com urgência, indicação, por parte do
município, de uma proposta de edifício para instalação, imediata, do Posto da
GNR (Secção da 4ª Companhia do Batalhão nº1), destinada a Sintra. Segundo o
conteúdo da mesma acta, é solicitado que seja providenciado a aquisição do
respectivo mobiliário das instalações.
Apesar de termos
esta indicação cronológica, de Agosto, só encontramos um ofício, remetido pelo
Comando da Guarda Republicana, para o Presidente da Câmara Municipal de Sintra,
em 15 de Setembro de 1912, Informando
da deslocação de um delegado do Comando Geral para inspeccionar as instalações
destinadas ao Posto da GNR de Sintra. Documento, este, que julgamos
que tenha originado, então, uma resposta, resultante da deliberação unanima da
reunião de Câmara[2], de 17 de
Setembro, em decidir favoravelmente a favor desta pretensão do Comando Geral da
Guarda Nacional Republicana, como também, de abrir concurso para fornecimento
do mobiliário pretendido.
A deliberação
que é registada[3] leva-nos a
conjecturar sobre a falta de património imóvel disponível, na Vila, pelo
Município em virtude de ser deliberado solicitar à Direcção de Obras Públicas a
cedência de uma parte dos anexos do Paço de Sintra que estava previsto demolir,
para aí, instalar, provisoriamente o Posto da GNR.
A resposta da Direcção das
Obras Públicas, do Distrito de Lisboa, é trazida à reunião de câmara de 1 de
Outubro[4], questionando
qual o tempo necessário para se efectuar o aquartelamento definitivo do Posto
da GNR, a fim de se fixar o prazo de cedência dos anexos do Paço de Sintra. Os
vereadores presentes deliberam suspender qualquer resposta, principalmente
sobre as instalações alternativas à proposta colocada na utilização do casaria
do Paço da Vila, devido à ausência do vereador Sá Piedade, responsável pelo
processo. Motivando esta situação um novo ofício do director da Primeira
Direcção das Obras Públicas, do Distrito de Lisboa, apresentado à reunião de
câmara de 15 de Outubro[5], agora,
questionando, apenas, o tempo provável que a Câmara julga necessário para utilização
dos anexos do Paço de Sintra.
A deliberação
tomada, por unanimidade, sobre o teor da resposta, que o Vice-presidente Francisco
Rodrigues Ferreira Júnior terá de dar é de que não deverá ser necessário mais
de um ano.
Novamente, em acta de reunião de câmara[6],
ficamos a saber que o orçamento apresentado e aprovado para as obras de
adaptação a quartel da GNR, dos anexos do Paço de Sintra, como também do
mobiliário necessário, tem um valor total de 124 Mil Reis.
A
morosidade da execução do processo leva que, a 2 de Novembro de 1912, o Comando
Geral da Guarda Nacional Republicana volte a pedir informações, com urgência,
sobre o estado das Instalações destinadas ao Posto da GNR e se está
convenientemente mobilado e, caso essa situação não se verifique, qual a data
prevista.
De igual modo,
através da documentação respeitante à correspondência recebida, ficamos a saber
que a parceria da Guarda Nacional Republicana no apetrechamento das
instalações, correspondendo ao envio
da senha de remessa de um cabide armeiro destinado ao Posto sintrense e,
simultaneamente, envio de um recibo para pagamento no valor de 4520 Reis, da
responsabilidade da Câmara Municipal.
A 28 de Novembro de 1912 o Administrador
do Palácio Nacional de Sintra remete à Presidência da Câmara a informação
recebida, naquele palácio, do Director Geral da Fazenda a comunicar o despacho
do Ministro das Finanças a ceder, provisoriamente, à Câmara Municipal de
Sintra, o anexo das cocheiras do Palácio, para servir de instalação do Posto da
GNR.
Sabemos, também, que dois dias depois,
através da Ordem de Pagamento nº 606, o Fiscal Francisco dos Santos, levanta da
tesouraria municipal a quantia de 3.950 Reis, para pagamento de salários (2ª
quinzena de Novembro), do pessoal empregado no serviço de limpeza, caiação e reparação
do anexo das cocheiras do Palácio. Situação esta que se repete, através da
Ordem de Pagamento nº 623, agora, datada de 16 de Dezembro de 1912, no valor de
30.000 Reis, para pagamento de salários respeitantes à 1ª quinzena de Dezembro
do pessoal empregado no serviço de obras de adaptação do anexo destinado à
instalação do Posto da GNR.
A 30 de Novembro de 1912 o semanário
republicano, «O Concelho de Cintra», noticiava que ia ficar instalado até ao
dia 14 de Dezembro o posto da Guarda Nacional Republicana, na Vila de Sintra,
assumindo o comando do Posto o Alferes Dias Costa.
O Município irá intervir mais algumas
vezes nas instalações da Guarda Republicana para proceder a pequenas reparações
(reparação de uma chaminé), a melhoramentos pontuais (colocação de uma
campainha eléctrica na porta da caserna da guarda) e limpeza do espaço,
reclamadas pelo Comandante do Posto, conforme podemos observar pelas
deliberações tomadas nas reuniões de câmara, respectivamente, de 21 de Janeiro[7]
e 11 de Fevereiro de 1913[8].
Em remate de curiosidade deste
apontamento de cronologia sintrense, termino como comecei, e no aproveitamento
da frieza de interpretação, obtida através dos documentos, com mais um
apontamento do “ser português”, manifestado na presença institucional
centenária provisória do Quartel da Guarda Nacional Republicana da Vila de
Sintra.
[2] Estão presentes na reunião o Vice-presidente Francisco
Rodrigues Ferreira Júnior, os vereadores Manuel Duarte
Resina, Manuel Ferreira
Cosme e José Ferreira de
Sá Piedade e o Administrador do Concelho o Dr. José de
Ponte e Sousa.
[3] Livro nº 23 - 1911 (29 de Março) – 1913 (25 de Fevereiro),
fólio 331.
[4] Livro nº 23 - 1911 (29 de Março) – 1913 (25 de Fevereiro),
fólios 337-338.
[5] Livro nº 23 - 1911 (29 de Março) – 1913 (25 de Fevereiro),
fólio 342.
[6] Livro nº 23 - 1911 (29 de Março) – 1913 (25 de Fevereiro),
fólios 369-370 [reunião de 19 de Novembro].
[7] Livro nº 23 - 1911 (29 de Março) – 1913 (25 de Fevereiro),
fólio 387.
Estou verdadeiramente emocionada com tudo o que li e sobretudo por ter encontrado o nome do meu avô Francisco Rodrigues Ferreira Junior que há muito procurava saber qual tinha sido verdadeiramente o posto que tinha ocupado na vila de Sintra. Sei agora que foi vice-presidente da Câmara (1912) embora toda a minha vida pensasse que tinha sido mesmo presidente da Câmara. Sei que morreu muito cedo e que o meu pai era na altura ainda muito novo. O meu pai também morreu relativamente novo 60 anos em 1962.
ResponderEliminarEstou muito grata a quem fez este trabalho.
Raquel Dantas