O comboio
parte e Sintra fica, aos poucos, para trás. O verde dá lugar ao cinzento que
caracteriza o território urbanizado. Depois de algum tempo sem viver este
percurso, tudo parece novo.
Os estendais
enchem de cor os edifícios, conferindo-lhes uma nova pele que o vento manobra
conforme a sua vontade. É ao seu toque que as roupas dançam, entrelaçando-se e
acrescentando confusão às fachadas gastas pelo tempo. A nova paleta de cores
funde-se, assim, às varandas, às manchas esverdeadas de humidade e às marquises
claramente descontextualizadas.
Começa a
chover. As pessoas debruçam-se à janela na tentativa de salvar a roupa de uma
nova carga de água. Também dentro do comboio, apesar de salvos da tempestade,
os passageiros demonstram o seu desconforto, pedindo a todos os santos para que
termine mal o corpo passe a porta da carruagem rumo ao exterior. A rua
enfeita-se de chapéus de várias cores e padrões que se movem à velocidade dos
passos, transformando-a num palco onde o movimento se acentua.
Os pés
escorregam na irregular calçada portuguesa mas, no comboio, contactam de modo
forçado e desconfortável com as pernas e as mochilas de quem se senta nos
bancos mais próximos. Fala-se de tudo, apesar de identificarmos conversas que,
preferencialmente, deveriam apanhar outro comboio. Fala-se da chuva e dos males
do corpo, do trabalho e dos males que caminham de mãos dadas com a nossa raça.
Fala-se do mundo através de ideias oferecidas pelo horário nobre dos nossos
nobres canais de televisão.
Os muros
coloridos por grafittis sucedem-se,
dinamizando o rápido percurso. Consigo identificar novos desenhos. De cotovelo
pousado no parapeito da janela tento ler, muitas vezes sem sucesso, as
mensagens deixadas por quem as pintou. A terra e o musgo deixados pelo inverno
rigoroso dificultam a minha tarefa, mostrando que a natureza tem também uma
palavra a dizer.
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