Observamos
a história e encontramos uma tendência natural para as sociedades qualificarem
as suas gerações com os mais variados epítetos. Na nossa terra tivemos desde a
“geração de 70”, de tão nobres construtores da cultura portuguesa, à “geração
de ouro”, que prometia triunfalismos futebolísticos históricos. Ora, eu, mero
português nascido no dealbar da segunda metade da década de 1980, não faço,
obviamente, parte nem de uma nem de outra. Cresci com a geração que me antecedeu
a ser apelidada de “rasca” e cheguei à idade adulta à “rasca”, contudo,
acredito sinceramente que a minha geração é, antes de mais, a “geração
perdida”.
O
mundo ocidental mudou com a crise financeira e económica iniciada em 2008, as
suas causas e consequências são sobejamente conhecidas: a ganância de uns levou
ao empobrecimento de quase todos. Todavia, os problemas não nascem em 2008, a
crise é simplesmente o ponto de chegada de um leviatã que nasceu com a
desregulação dos mercados financeiros, na década de 1980, e que foi alimentado
com a criação sem critério da Organização Mundial de Comércio, do
mercado comum europeu e do EURO, durante a década de 1990.
Durante
a primeira década do século XXI, os efeitos das opções políticas tomadas nas
décadas anteriores fizeram-se sentir no crescimento económico e,
consequentemente, no desemprego, com uma estagnação económica em toda a União
Europeia (crescimento que muito dificilmente ultrapassava o 1% do PIB), um
constante aumento do desemprego e aumento da precarização das relações
laborais, apesar dos resultados históricos das empresas relacionadas com o
mercado financeiro (Banca, Seguros, Fundos) e o mercado imobiliário.
Quando
a crise nacional se instalou definitivamente, em 2011, o desemprego em Portugal
era de 12,7% (no ano anterior à entrada em circulação do euro, 2001, era
de 4,1%) e a taxa de desemprego jovem era de 27%. Esta geração,
confrontada com a mais elevada taxa de desemprego de sempre, foi apelidada de
“geração à rasca” ou “geração 500 euros”, num epíteto adoptado do salário a que
poderiam ambicionar.
Mas
a história, na sua generosidade ou tragédia, não pára. Além do desemprego e dos
salários de valor ridículo, esta geração tem sido vítima da maior precarização
das relações laborais, desde 1974, com os sempre presentes “recibos verdes”
(vinculo atribuído a independentes ou pequenos empresários), com os “estágios
profissionais” onde se opera a processos de exploração nojenta,
nomeadamente através da não remuneração dos estagiários (paradigmático é o caso
da advocacia, onde os jovens advogados são obrigados a “estagiar” no mínimo 24
meses para ter acesso à profissão e a grande maioria não é remunerada), e
trabalhos a “part time” com metade do salário ridículo e a
totalidade da actividade.
Esta
geração, também qualificada como a melhor preparada na história do país, soube
interpretar a mensagem e muitos partiram para outros horizontes de esperança, deixando
para trás família, amigos e um país que lhes deu qualificações que utilizarão
no enriquecimento de países terceiros… Outros tantos, que não tiveram essas
qualificações, partem simplesmente para as rotas da pobreza e da exclusão
social, entre estes, estão também aqueles que desistem de procurar emprego, os
que saem do sistema e aqueles que abandonam a vida…
Actualmente,
a conjuntura é pior e continuará a piorar. No 1º trimestre de 2013 a taxa de
desemprego em Portugal era 17,7% e a taxa de desemprego jovem era de 42,1%,
ou seja, quase metade de uma geração está desempregada e a outra metade vive em
relações de elevada precariedade! (estes números não contabilizam os jovens
emigrantes, que em 2012 foram cerca de 200 mil).
Será
possível a viabilidade do país nesta conjuntura? Quais as razões desta
tragédia? Como é que foi possível? Quem foram os malfeitores que fizeram isto
ao meu país? São as questões que emergem nos momentos da revolta e da
desesperança.
As
causas desta desgraça foram um conjunto de opções políticas que não tiveram o
mínimo de visão histórica, cultural e económica. Entre outras, as mais
significativas foram a adesão de Portugal ao EURO, sem ter a economia preparada
para uma moeda forte, foi a adesão ao mercado comum sem reservas, o que nos
permite uma pauta aduaneira com a China igual à da Alemanha, a desregulação dos
mercados financeiros e a sua criação de produtos sem ligação à economia real,
e, por fim mas não menos importante, a corrupção da nossa comunidade política e
empresarial.
A
esperança de um futuro diferente, sem metade da população desempregada daqui a
uma década, passa obrigatoriamente pelo renascimento do nosso amor próprio, da
nossa cultura, dos nossos valores universais e humanistas, onde a pessoa é o
centro de todas as coisas e não um mero factor de produção na estatística
económica. Temos que ouvir mais o Agostinho da Silva, o Eduardo Lourenço, entre
outros, e menos os comentadores de domingo.
Como
medidas concretas é fundamental a saída de Portugal do Euro e construir um novo
sistema político, mais transparente e de maior proximidade entre o eleitor e o
eleito, que permita o referendo das principais questões para a vida colectiva.
Até
à chegada desse dia, por tudo o que foi dito, acredito que a minha geração não
está à rasca mas perdida…
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