O
teu olhar outrora brilhante e alegre, agora baço, era uma janela aberta sobre
os teus pensamentos e pesadelos futuros, para a viagem que brevemente irias
protagonizar em busca de melhores dias, levando-nos a viajar no tempo recente,
no qual os teus avôs e quiçá os teus pais já haviam efectuado tal viagem por
terras estranhas, quando a fome e a falta de trabalho lhes bateu à porta.
Chegou agora e infelizmente a tua vez de partires, com a amargura no coração, e
a incerteza na mente de uma tal aventura, em tudo semelhante à já anteriormente
realizada pelos nossos intrépidos navegadores, na altura e no dizer do poeta,
“por mares nunca de antes navegados”.
A
história tem o condão e a certeza de se repetir uma ou mais vezes ao longo das
várias gerações. Sempre as mesmas razões e os mesmos motivos. Sempre os mesmos
objectivos e igualmente a mesma incerteza. Para trás ficam algumas raízes
familiares e amigos, coisas e locais que nos viram desabrochar e crescer.
Ainda
não partiste e já és perdedor. Lutas para que os teus olhos se mantenham secos,
como os rios e ribeiras do teu país em finais de época estival. Ainda não
partiste e algo já se quebrou em ti. A alegria que o teu corpo irradiava antes,
perdeu-se nessa forçada viagem.
Todo
e qualquer sonho que porventura bailasse no teu pensamento, vai mais uma vez
ficar adiado, como adiado continua e irá continuar o teu país.
A
tua partida, essa, é que não pode mais continuar a ser adiada. Não restam
alternativas para a tua busca de uma realização pessoal a qual não consegues
concretizar no teu país, o qual não tem capacidade de resposta para as
necessidades, que vive embrulhado em si próprio, incapaz de definir um rumo e
de se esforçar numa aposta de satisfação individual e colectiva dos seus
cidadãos.
Não
estão fáceis nem são acessíveis os trilhos que terás de percorrer, lutando por
ultrapassar as inúmeras barreiras que irão continuar a surgir no teu caminho e
que te imporão dilemas a todo o momento.
Não
és só tu que partes, que te debates interiormente, e que lutas para não deixar
transparecer o teu estado de alma. Os que ficam são menos reservados e não
fazem esforço algum para facilmente derramar umas lágrimas pelos cantos da casa
ao verem-te partir, e imaginarem-se afastados dos seus entes queridos.
É
necessário colocar o coração mais alto e procurar ser mais racional no
pensamento. Vivemos num mundo global e como tal torna-se necessário e urge
abrir horizontes, não recear o desconhecido, e partir para a aventura. Novos
mundos e novas vivências, experiências aprendizagens e saberes, trocas e
partilhas, todos contribuem para o enriquecimento e fortalecimento, para o
aprofundamento das competências, bagagens necessárias para ultrapassar os
vários desafios que nos surgem e que por vezes somos forçados a enfrentar no
nosso percurso de vida.
Vemos
ouvimos e lemos e de nada adianta permanecermos indiferentes ao que nos cerca e
assalta a todo o instante. Por muito insensíveis que queiramos ou procuremos
ser, os problemas, acontecimentos e fenómenos vários que nos rodeiam são de tal
forma gritantes, violentos e perturbadores de toda uma ordem social, que nos
incomodam, que a todos dizem respeito, que não há mesmo forma de deixar passar
ou esquecer, ou mesmo omitir. No mundo global e sem fronteiras onde vivemos,
onde as distâncias estão esbatidas e em algumas circunstâncias, à mão de um
simples click num botão ou interruptor, com uma actualidade impressionante, que
qualquer um de nós quase pode sentir que faz parte integrante daquele cenário,
ou é tocado directa ou indirectamente por ele. Todos fazemos parte de uma
imensa rede que não se quebra com facilidade, e que ao mínimo alerta de
ruptura, logo surgem outros obreiros a compor as brechas. Onde os direitos e
conquistas ameaçam ruir e serem rasgados após anos e anos de luta por toda uma
classe de trabalhadores votados ao esquecimento e agora atirados para o lixo
considerados impróprios e usurpadores de direitos.
Só quero o que me é devido
ResponderEliminarPor me trazerem aqui
Que eu nem sequer fui ouvido
No acto de que nasci.