Com o desaparecimento do período revolucionário e
quase quarenta anos após o 25 de abril de 1974, a velha palavra de ordem
“o voto é a arma do povo” desapareceu para dar lugar, ao afastamento
por parte deste mesmo povo da cidadania participativa, que na minha
opinião também deixou de ser propositadamente promovida pelos sucessivos
governos.
Este afastamento do cidadão da cidadania participativa constitui uma
ameaça para a sobrevivência e manutenção do sistema democrático, pois o
voto é a principal alavanca da democracia.
Este estado de alienação social por parte do cidadão na participação dos
destinos do país faz com que a cidadania se torne um ato cada vez mais
individual, quando deveria ser um ato coletivo e de impulso para a
construção e desenvolvimento de uma sociedade mais justa. É urgente
combater este afastamento que também se deve a questões culturais, muito
agarrado à ideia de que a política é um conceito abstrato e de pouco
valor para a vida em sociedade. A sociedade tem de criar a consciência
no cidadão de que a política influencia todos os aspetos da vida. Todos
vemos alguns sinais de crise no funcionamento da sociedade e nos valores
da democracia, manifestações de falta de civismo como a ação dos meios
de comunicação social, que não estimulam a opinião pública e a
manipulam, o enfraquecimento de valores éticos, a prática da corrupção,
as elevadas taxas de absentismo nos processos eleitorais, a fraude
fiscal, o desinteresse pela vida pública, a indiferença e a desconfiança
nas instituições políticas. Todas estas questões afastam o cidadão da
participação na vida pública, e rompem os laços que nos unem à vida em
comunidade.
O cidadão sabota inconscientemente a cidadania, desresponsabilizando-se e
projetando essa mesma responsabilidade no Outro, um conceito semelhante
ao da bola de neve mas com a consciência coletiva.
Este “eclipse” do cidadão da participação ativa na sociedade, pode
conduzir a médio prazo a uma crise civilizacional, o esquecimento dos
valores democráticos a falta de conhecimento dos direitos e deveres
sociais consagrados na Constituição Portuguesa, o individualismo e a
apatia coletiva que se vive em Portugal conduz-nos ao retrocesso da
civilização, pois transforma-a numa sociedade quebrada, sem opinião, mais
intolerante, menos consciente, mais injusta, mais corrupta e
discriminatória.
Se a definição de pessoa é “ um ser em relação” então parece-me
importante que cada um saiba estar em sociedade de uma forma socialmente
humanizante, os mais novos aprendem com os mais velhos as gerações mais
adultas têm o dever cívico de formar comunidades de cidadão atentos
conscientes, participativos e responsáveis. É partilhada por todos a convicção de que o exercício da cidadania é
sustentado por um conjunto de valores e de virtudes aplicados
universalmente, a justiça, a verdade, a coragem, a liberdade, educação,
solidariedade, a partilha, a atenção a todos e, especialmente, aos que
têm mais dificuldades, seja em que campo for. Mas o que é a cidadania?
Citando Jorge Sampaio “ A cidadania é a responsabilidade perante nós e
perante os outros, é a consciência de dever e de direitos, é o impulso
para a solidariedade, é a participação e o sentido de comunidade e de
partilha, é a insatisfação perante o que é injusto ou que esta mal, é a
vontade de aperfeiçoar, de servir, é o espírito de inovação, de audácia
de risco, é pensamento que age e ação que pensa".
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