quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Nuvens do Norte

JORGE TELLES DE MENEZES











As nuvens
que às sete horas da tarde        
desta serra se aproximam,
trazem a bruma do norte,
fria, húmida e ventosa,
e à alma recordações
de mansas paisagens
árvores em fila
numa estrada rectilínea
que conduz à confortável Landhaus.
Tudo é burguês e arranjado
no Norte.
As pessoas calmas e doces,
sempre prontas para um chá
na sala, junto à lareira.
A paisagem encanta fotograficamente
o olhar.
Mas aqui no Sul,
ou Ocidente – como hoje queria um polaco,
tudo é imaginativo e apaixonado,
caracteres rudes, palavras ásperas.
Moro perante uma paisagem heróica
que me deixa em êxtase
ao poente,
arrebato-me e estiolo,
incompreendido,
no próprio florir da ideia,
frustro-me e amaldiçoo – o Sul.
Amar-te e também odiar-te
Por não permitires que seja sereno – oh Sul!
E desejo partir outra vez,
para um fim de tarde
com música de Bach,
nevoeiro, filas geométricas de árvores,
risos amigos, chá e uma lareira
ardendo na angenehmen Haus,
e a consciência burguesa e profissional
de merecer o conforto, a cultura e a paisagem.


(Poema escrito em S. Pedro de Sintra, em pé, à janela da casa da Rua do Campo, a 6 de Setembro de 1986)

2 comentários:

  1. Fernando Dias Antunes21 de agosto de 2013 às 21:41

    Belo poema inspirado(r) de uma época em que a Tertúlia poética e artística sintrense vibrava em torno de um triângulo das Bermudas onde o reflexo da Mons Lunae se sentia no Outro Lado do Espelho da maldita contra-cultura.

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  2. Já escrevi um comentário, não percebo porquê, mas não apareceu. Vou ver se este aparece... Esse famigerado triângulo cultural não foi estudado em todo o seu impacto na vida social, económica, e acima de tudo cultural de Sintra. A Tertúlia editora trouxe grandes poetas até Sintra, organizou um Congresso Mundial de Poetas, com a presença de um Nobel da Literatura. A galeria O Outro Lado do Espelho foi uma plataforma altamente giratória para encontros memoráveis de artistas, poetas, pensadores, pintores, e um personalizado centro de irradiação cultural. A escola Mons Lunae, trouxe centenas de estrangeiros para Sintra para aqui aprenderem Português como Língua Estrangeira, e deu um contributo directo para a economia local, famílias que alugavam casas ou quartos, cafés e restaurantes, bancos, etc. etc. Tudo num período de 5 anos, entre os finais da década de 80 e início da de 90. As lacunas que o desaparecimento desses projectos deixaram ainda não foram preenchidas.

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